segunda-feira, 30 de junho de 2008

ZAPPING IDEAS

Faço parte da última geração TV no Brasil. Aquela mesmo, que ficava na frente da dita cuja o dia todo, com babás eletrônicas pela manhã, via o Bozo, brincava com brinquedos da estrela e adorava balas boneco. Não havia TV a cabo, Internet e os vídeo games estavam chegando por aqui. Não havia esse linguajar tedioso de “MSN”, “scraps”, “deletar”, etc. Mandar torpedo pra mim era detonar uns submarinos inimigos no “Seaquest” do Atari 2600 com meu pai.

Nunca gostei muito de TV. Isso pode soar como contradição, mesmo fazendo parte dessa última geração. Gostava mesmo era de desenho, seriados e gosto até hoje. Quando eu descobri a Turma da Mônica e uns “comics” americanos, a TV ganhou um concorrente pra minha distração. Pra ser sincero, sempre fui e até hoje sou mais fã da turminha paulista do Maurício de Sousa (um dia quero conhecer esse cara pessoalmente) do que aqueles yankees arrogantes. O Homem Aranha passa, porque ele é comum, um nerd que rala em busca de seus trocados tirando fotos, mora mal em New York e passa batido na multidão.

O lado legal da caixola é que na TV passa filme. Sempre achei a TV brasileira uma grande merda, salvo raras exceções. Detesto novelas, os jornais só noticiam merdas, odeio fofocas e “reáliti chous”. Fogueira de vaidades nunca foi a minha, sem contar nas grandes merdas que o povo fala e o restante diz amém. Só a TV a cabo salva.

Pra piorar a situação, agora Deus está na TV. Ter que aturar pastores e seus rebanhos contando milagres é demais. Hoje em dia há umas 10 opções de canais religiosos, sem contar os horários que as mesmas seitas alugam na TV aberta. Até os católicos entraram na dança. Hoje em dia a “graça” vem das antenas e via raios gama.

Ah, mas tem o futebol! Sim, um bando de caipira jogando e o melhor é sempre vendido pra Europa. E aturar um bando de paulistas bairristas torcendo descaradamente pros seus times é um saco. O Galvão Bueno também me irrita. O que diverte são os comentários chavões. Prefiro ver os jogos que rolam na Europa, pelo menos os nossos melhores jogadores detonam tudo por lá.

Realmente estamos num beco sem saída. Pra piorar, eu trabalho numa TV. Se isso é um sonho? Pinóia! Salário curto (ainda bem que rolou aumento), sem fins de semana ou feriados. Estar dentro dessa usina de força é bom pra você ver como as coisas funcionam. Se há pessoas que criticam a merda da TV, pode ter certeza que há merdas dentro da usina também.

Nunca gostei muito de TV. Mesmo fazendo parte daquela geração dos anos 80, que hoje está praticamente adulta. Se ela trouxe ou prorrogou a juventude eu num sei, mas que ela cisma em trazer minha velhice é fato. Filmes idiotas, programas imbecis, jornais nojentos, operários e mentores sedados, peladas insones, dias sem folga debaixo de um ar condicionado a 13 graus (pra quem é carioca isso é o pólo sul, acredite!), sem fins de semana, sem feriados, sem família por perto...

Por essas e outras, nunca gostei de TV.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

RICOS PEQUENOS, POBRES GRANDES

Ainda no assunto Eurocopa – que já está perto do fim -, acesso o site yahoo e quando clico no link pra ver as novidades da competição, sou invadido por uma enxurrada de animações em “flash”, com direito a introdução e o escambau. A coisa é muito bem organizada, bem bolada, toda colorida e repleta de informações.

A parte que mais chamou a atenção foi a opção “times”, com as bandeiras dos países participantes em ordem alfabética. Quando você entra no país, os caras botam aquela foto clássica do esquadrão, com os resultados, escalação com foto, peso e altura (por que eles insistem nessa informação inútil? É futebol e não desfile de moda!), uniformes e a localização geográfica: onde fica, quantos habitantes e o tamanho do território do país. O mais legal é o “zoom” no mapa cinzento da Europa.

Foi justamente o mapa e as informações geográficas que me fizeram refletir. Vi os países e conseqüentemente, fui comparando aos números do Brasil e do terceiro mundo. Tudo bem, todo mundo anda cansado de saber que a Europa – exceto a Rússia – cabe no Brasil. E mesmo se a gente colocasse a Rússia na jogada, não dava muita diferença.

A metade dos participantes tem a população menor que a da região metropolitana do Rio de Janeiro, com 13 milhões de pessoas. Áustria, Croácia, Suécia, Holanda, Grécia, Republica Tcheca, Portugal e Suíça ilustram essa afirmativa. Se você olhar bem pra essa lista, alguns desses países encabeçam os rankings de qualidade de vida, renda, organização e igualdade social.

Países como Alemanha, França e Itália já são maiores, tudo com mais de 60 milhões, mas com a economia forte, são 3 dos 8 paises mais ricos do mundo. Não é á toa que todo mundo tenta furar a fronteira deles pra tentar uma vida melhor. Mesmo assim, as metrópoles desses países não chegam a ter o tamanho da população de Belo Horizonte, a terceira cidade do Brasil com 3 milhões. Distribuição é uma palavra concreta e funcional no velho mundo.

Quando viajo de metrô pelo Rio, vejo o oceano de favelas e guetos que não param de surgir, na medida em que você adentra o subúrbio. É um quadro preocupante, pois a miséria cresce e não há mais espaço. O próprio sistema de transportes no Rio é saturado. Depois de ver esses números, tenho a sensação de que eu esbarro com a população desses pequenos paises do velho continente todo dia, quando fico preso no trânsito.

Os pobres, inclusive na Europa são numerosos. Romênia e Polônia tem mais de 20 milhões. Já a Turquia, campeã em imigrantes para o oeste da Europa encabeça a pequena lista dos participantes. A população turca é de 63 milhões, mas ninguém soma o número de imigrantes, pois se isso fosse pra ponta do lápis, o número engrossaria. A Rússia é um caso a parte, pois mais da metade dela está na Ásia. Embora tenha uma população de 150 milhões, grande parte se concentra no lado europeu.

Eu nunca olhei com bons olhos esse gigantismo do Brasil e o fato dele “engolir” a Europa. O fato do hino dizer que somos “gigantes pela própria natureza”, “impávido colosso” foi o suficiente pra por na mente do brasileiro – sonso e inerte por natureza - um gigantismo que não quer dizer nada exceto a apatia. Prefiro os números modestos e funcionais lá do velho continente: troco inclusive o clima e os títulos de futebol com eles. Como diz o Engenheiros do Hawaii, “eu sempre quis viver no velho mundo”.

terça-feira, 24 de junho de 2008

COISAS DA EUROPA (pt 2)

Há coisas tão absurdas que você não é capaz de acreditar. Logo de cara diz que é mentira ou que nego anda viajando. Também não acreditei quando soube desse fato, mas o que vou contar aqui aconteceu de verdade e há testemunhas, mas não vou dizer nomes.

Uma banda brasileira realizava o sonho de toda pessoa que toca heavy metal no Brasil: uma tour pela Europa. Numa das datas da Suíça, os caras pararam numa cidade com o carro repleto de equipamentos – brasileiros, vale ressaltar -, e desceram pra ver um estúdio para ensaiar, pois logo mais teriam mais um show a realizar.

Como todo brasileiro ressabiado e cabreiro, perguntaram: “poxa cara, a gente pode deixar o carro cheio de “equipos” aqui na rua mesmo? É seguro?” O manager que acompanhava a banda respondeu afirmativo, que não havia perigo nenhum. Tranqüilizados, subiram, verificaram o local, gostaram e uma hora depois, desceram pra pegar todo o equipamento e deixar no saguão do estúdio suíço.

Ao abrirem o carro e constatarem que não havia nem um cabo pra contar história, o desespero tomou conta dos caras: perdidos, sem equipamento na Suíça. Literalmente fudidos. Pânico, revolta, desespero e quem sabe até choro. Imagine você sair do Brasil pra ser roubado na Suíça! Todos então foram a delegacia da cidade.

Chegando na delegacia pra registrar o ocorrido, prestar depoimentos e toda aquela burocracia, eis que os policiais, extremamente educados e sorridentes, falam sobre o que viram:

- Vocês são do Brasil né? Então são vocês os donos do equipamento deixado na rua tal? Eles estão todos aqui na delegacia.

Menos mal, mas nem tanto. Quando já esperavam ser achacados e prontos pra molharem a mão dos simpáticos policiais suíços pra liberarem a parafernália “made in brazil”, os homens da lei explicaram o porquê da confusão:

- Nós vimos a van estacionada na rua com todo aquele equipamento e concluímos que era perigoso deixar naquela situação. Então, pegamos tudo e trouxemos pra cá pra delegacia, já esperando pelos donos.

Aliviados, pegaram tudo de volta e seguiram atordoados com a educação e o respeito daqueles simples policiais suíços.

Igualzinho ao Brasil.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

COISAS DA EUROPA

A Eurocopa está acontecendo lá no velho continente e eu aqui no “novo mundo” assisto, sempre que posso, aos jogos. Tudo bem que eu sou louco por futebol, mas confesso que muitos jogos são um pé no saco, principalmente na primeira fase. Pouca habilidade, poucas jogadas de risco e partidas insossas. Como o tempo anda frio, é bom porque essas partidas chatas valem de sonífero e o sono da tarde fica melhor. Mas nem tudo é marasmo. Vale ressaltar que esse quadro não é regra e já assisti jogos excelentes, principalmente na reta final.

Durante muito tempo a imagem das arquibancadas britânicas, sem nada entre o público e o gramado me chamou a atenção. Tudo bem que no passado isso era impossível, mesmo assim, os súditos da rainha souberam sair daquela situação caótica do passado. Mas a cena dos jogadores holandeses comemorando com suas famílias e pegando seus filhos no colo ali no gramado depois do apito final com certeza vai ficar na minha memória por muito tempo.

Organização, educação, pontualidade e obviamente bons jogos formam uma alquimia pra lá de convidativa nesses eventos europeus. Soma-se a isso, os gramados verdinhos, sem buracos, o povo todo ali, torcendo na maior felicidade (e muitas vezes torcedores rivais juntos, mas só na Eurocopa) sem confusão, bebendo as melhores cervejas do mundo, estádios limpos, tudo no lugar, na pontualidade e até mulheres bonitas.

Os europeus aprenderam a ganhar muito dinheiro com futebol. Encararam o fato de que o produto pra ser vendido, precisa de uma bela imagem. Tudo para que você que gosta de futebol faça o simples ato de ligar a TV e ver o jogo: um pontinho a mais no “contador de espectadores” e milhões na conta dos patrocinadores. Uma pena para nós, latino-americanos apenas poder desfrutar via satélite. De qualquer forma, quem consome fica satisfeito. Enfim, Europa.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

O DILEMA DA DIETA

Precisava emagrecer. 20 quilos. Então, entrei num regime que a cada dia ganhava características de abstinência. Pra ajudar no processo de emagrecimento, entrei na academia. Tive que trocar noitadas de cerveja, torresmo, tardes de sorvetes, por saladas, suor e esteira.

Depois de uma hora gastando calorias pra emagrecer e moldurar o corpo roliço saio da academia com um desejo mórbido por sorvete. E Brahma Black. Uma mulher havia me dito que havia um clube barato pra fazer natação. Caro ou barato, eu teria que subir o Méier e atravessar por milhares de padarias e lanchonetes até chegar lá. A carne é fraca e o estômago mais ainda. Cérebro de gordo é suscetível à comilança.

Vou até o portão de casa e paro. Dou meia volta e saio de novo. Olho pra trás (conseqüência da paranóia (sub) urbana) sempre achando que alguém observou meus passos e constatou a minha sandice. Hora de encarar os fatos e dobrar a esquina.

A Dias da Cruz está lotada como sempre mas como era época de natal, o trânsito, tanto de pedestres como de veículos triplica. Não ando nem cinco minutos e uma máquina de casquinha de sorvete a um real logo de cara. Metros depois, um McDonalds. Lá não aceita sodex, só grana. Lembro-me que sobrou muito pouco do meu 13º salário e passo adiante. Estou resistindo o quanto eu posso.

Atravesso a rua e dou de cara com uma padaria. Aí é covardia. Acabo de sair da academia, preciso perder peso, reeducar a alimentação e aparece justo uma padaria? Doces, tortas, salgados, frituras. Quanto maior abstinência, maior é a tentação. Mas vamos em frente.

Chego ao shopping e esqueço o motivo da caminhada. De um lado, um Bob’s lotado aceitando meu sodex e vários milk shakes e hambúrgueres nas fotos do cardápio. Do outro lado, um quiosque da Brahma repleto de pessoas sorridentes, livres, sem fazer dietas, bebendo aquele chopinho gostoso de fim de tarde. As imagens dos milk shakes, chopes e sorvetes agridem meus sentidos assim como os nazistas na Polônia. Respiro fundo, recapitulando tudo, dou meia volta e entro na livraria.

Alívio. Numa fração de segundos as revistas e os livros me fazem esquecer por completo o demônio da gula. Vejo um Nelson Rodrigues na prateleira. Chopes, cervejas, sorvetes, frituras e aquele mundo rico em glicose e gordura cedem espaço as revistas e a Bukowski, Lawrence, Quintana, Agatha Christie... Mergulho de cara nos “pocket books”, namoro os preços e vejo que se gastasse ali meu 13º, que já respirava com ajuda de aparelhos, teria sua eutanásia na livraria. Comprei mais um “pocket book”, não fui a tal academia ver a natação e voltei com a alma contente pra casa. Melhor gastar com um livro do que com as guloseimas ou naquelas padarias. Volto pra casa feliz por ter resistido bravamente e como agradeço aquela livraria. Até porque livro não engorda!

quarta-feira, 18 de junho de 2008

LÚBRICAS INTERSECÇÕES

Ricardo é um rapaz recém formado em Turismo e se preparava para fazer o exame de Cambridge, depois de anos freqüentando o curso de inglês. Apesar do diploma embaixo do braço, colecionava frustrações e um certo arrependimento por ter escolhido esta área de atuação. Tinha a consciência de que se não tomasse cuidado, passaria a vida inteira nessa profissão, perspectiva essa que não agradava em nada o pobre garoto. Mesmo assim, diferente da maioria de seus colegas formandos desempregados, estava trabalhando na área em que se especializou. Este fato servia como consolo, assim como as gorjetas que ganhava em dólar, em euro ou qualquer moeda que valesse mais que o real.

Apesar de tudo, Ricardo andava exausto. O desgaste já invadia outras áreas da sua vida, como o relacionamento conturbado com seus pais, a falta de tempo para si e para o seu namoro e a grana apertada. Ricardo namora Simone, uma garota que toda a mãe queria ter como filha: bem sucedida, estudiosa, recém formada, uma advogada de futuro promissor... Enfim, tudo o que o garoto procurava para a sua vida profissional.

Dia de trabalho para Ricardo. O garoto, que trabalhava em Copacabana na altura do posto seis (3 ou 4 estrelas, não importa) teria mais uma daquelas noites entediantes de sábado, onde veria todos saindo para se divertir e o “otário” indo ganhar seu pão. Pelo menos era assim como ele se sentia, pegando o ônibus que saía do Méier e atravessava a cidade. Seu amigo de jornada era um velho discman, geralmente com CDs do Napalm Death. Ele já conhecia até os rodoviários que faziam plantão no horário da madrugada.

Já estava chegando no limite da paciência. A cada dia que passava, a pressão aumentava. Simone querendo se casar o mais rápido possível (até porque só faltava isso, um casamento e filhos) e pedindo mais tempo para ficarem juntos as famílias pressionando, as contas aumentando, os pais de Ricardo reclamando de tudo, problemas de saúde... E ele no meio do fogo cruzado.

Já fazia muitos meses que Ricardo não saía sozinho. Tampouco dava as caras em farras com os amigos. Mas Ricardo assinaria a sua carta de alforria naquela noite. Ele precisava de uma válvula de escape urgente. Se a sua família e sua namorada não davam ouvidos para suas insatisfações, ele teria seu momento de catarse. Como sairia de madrugada do serviço e só encontraria Simone para o tradicional almoço de domingo, estava livre para enfiar o pé na jaca. Afinal, as ruas de Copacabana têm aquele clima de putaria, libertinagem. É quase impossível descer as ruas do bairro e não pensar em tomar um trago ou catar uma garota de aluguel. Era hora de chutar o balde.

Ele sai do trabalho e então desce Copacabana até o posto dois, próximo da Princesa Isabel. Depois de um dia (ou noite?) de trabalho, era a hora de tomar uns drinques, ver belas garotas e fumar um cigarro. Ali se encontram alguns dos mais badalados puteiros do Rio. A rua está repleta de turistas imbecis embasbacados com o enorme rabo das mulatas, um burburinho nervoso de pessoas alcoolizadas falando alto, barulho de copos se chocando e várias putas em busca de um programa. A última vez que pisou ali foi quando ainda era solteiro, ou seja, há mais de dois anos, com um amigo. Quando se lembrou da última vez que estivera ali, sua consciência automaticamente forçou o gesto de afrouxar a gravata e desabotoar o paletó. Ricardo sabe que está chamando a atenção das garotas. E como ele se diverte vendo aquelas cenas. Estava se sentindo como um exilado de volta ao seu lugar de origem. Nessa rua, algumas garotas tentavam ganhar um troco para se formarem pelas faculdades mais caras do Rio e pagar seus aluguéis em belos bairros cariocas. Outras, estavam ali tragadas pelo vício ou esperando a oportunidade de zarpar pro primeiro mundo. É a sucursal do inferno.

Ao entrar numa das boates mais caras e badaladas da rua, deu de cara com uma mulher bastante interessante. Ela usava óculos, aparentava ter uns 35 anos, tinha cabelos castanhos na altura do ombro e estava sentada isolada no canto. Ela possuía uma aura misteriosa e sedutora. Trocaram alguns olhares, mas ao invés dele sentar-se à mesa, foi pegar um drinque. Mesmo assim, reparou que a tal mulher não parava de secá-lo. Percebendo que a barra estava limpa, decidiu sentar-se à mesa e puxar conversa. A dita cuja se chamava Luciana e tinha muitas coisas para falar naquela noite.

A conversa começou com surpresas. Se Ricardo espantou-se com o fato de Luciana não ser garota de programa, a mesma achou curioso como alguém que nem ele estava ali á procura das ditas cujas. Ricardo aceitou o comentário como um elogio. Não demorou muito para que a coisa se dirigisse para assuntos mais pessoais. Foi aí que o clima realmente começou a esquentar.

Luciana explicou primeiramente o porquê de estar ali: primeiro, não era nem lésbica e tampouco puta e segundo, estava espionando o seu marido. Seu casamento de seis anos estava em crise. Discussões, mais discussões, ausência, carência, falta de afeto e principalmente, sexo. Desconfiada da ausência do marido, decidiu ver o que o tal fazia tanto na rua. A mulher seguiu o carro do marido e viu onde estava. Luciana entrou e desafiou o marido, dizendo que o próximo cara interessante que entrasse naquele recinto, ela flertaria e o levaria para fora dali. Tiveram uma discussão discreta porém bastante calorosa. O tal marido não levou a sério e já estava caçando alguma puta para aquecer a sua cama quando o que Luciana mais queria naquele momento de fato aconteceu. Luciana não perdeu tempo e perguntou para Ricardo se ele demoraria muito lá. Ele não hesitou, pagou a conta e quando percebeu, em menos de 20 minutos já estava no carro de Luciana e no meio da tempestade.

Somente após sair da boate foi que Ricardo realmente reparou aquilo que a escuridão da boate ocultava, em termos. Traços corpulentos que agradavam em cheio. Luciana era uma branquela, de quadris largos e bustos fartos e algumas neuroses.

Primeiro, vão até o Flamengo, onde ela mora e pede para Ricardo aguardar no carro, enquanto ela subia até o seu apartamento. Precisava pegar uns “acessórios” para apimentar a noite. Cerca de 10 minutos depois, ela desce e após tascar um beijo “caliente”, pergunta de forma irônica e maliciosa se Ricardo conhecia algum lugar para ficarem juntos. Como já passava das três horas da madrugada, Ricardo não pestanejou em guiá-la até um motel em Botafogo.

No motel, ela tratou logo de ligar a banheira de hidromassagem. Enquanto a banheira enchia, tirou os tais acessórios e perguntou se Ricardo gostava de maconha. Ele aceitou dar um tapa, mas foi ela quem apertou praticamente tudo. Seu marido não gostava da erva e então ela fumava escondida dele. Não satisfeita, preparou outro com os guardanapos do motel. Após apertar mais um baseado, fez um belo strip-tease e entrou na banheira.

Na empolgação do momento – pareciam dois adolescentes -, se esqueceram da camisinha. Luciana, então liga e pede uns preservativos mas se esquece de se vestir. Ricardo achou graça quando o garçom tocou a campainha da suíte e Luciana, estabanada (efeitos da maconha?), se enrolou numa toalha de rosto achando que aquilo esconderia seu corpo. Cena patética. Mesmo que se enrolasse numa toalha maior, seria impossível não reparar naquele corpo. Ela realmente chamava a atenção pelas suas medidas avantajadas.

Depois de uma boa preliminar, onde Ricardo procurou aproveitar cada pedaço daquela mulher e Luciana finalmente sentir excitantes toques e lambidas que a arrepiava toda, transaram. A maconha ajudou bastante no desempenho do casal, que transava na base da selvageria. Luciana era bem safada e decidida. Montava e cavalgava freneticamente. Gostou de saber que a vítima tinha a ferramenta maior que a do marido. Ela tomava iniciativa, batia, arranhava, gritava, gostava de dominar e tinha experiência, o que ajudava muito. Estava insaciável na cama, como se não transasse há muito tempo.

Na mente de Ricardo, os pensamentos corriam como um filme em “fast forward”. Imaginava todo o trajeto percorrido até aquela suíte em Botafogo, seus problemas, que diluíam cada vez que metia na mulher, a louca história de adultério, a traição que estava cometendo, além de questionar-se como estava com aquela mulher maravilhosa na cama. (convenhamos: que marido mais trouxa!) Estava aproveitando cada segundo daquele momento.

Depois da farra, tomaram banho juntos. Luciana era uma pessoa intrigante, boa de se conversar, pois tinha uns assuntos muito interessantes. Parecia ser uma mulher muito carente, de poucos amigos. E aos poucos revelava uns desequilíbrios. Depois de relaxarem, Ricardo olhou para o relógio, que já marcava 6:30 da manhã. Assustado, começou então a se vestir. Luciana intrigada, perguntou:

- Por que você está se arrumando? Que você vai fazer? Não tá gostando? Ainda não acabei. Fica tranqüilo que eu te levo em casa.

- Desculpe, mas tenho que ir. Adoraria ficar mais um pouco, mas não posso. Infelizmente eu trabalho hoje.

- Que pena...Logo hoje que eu te levaria a loucura! Não acredito no que eu estou vendo...Você não sabe o que ta perdendo...

Luciana não ficou lá muito satisfeita e partiu para o ataque. Queria mais. Ricardo não resistiu e ficou mais um tempo. No final, decidiu ir embora. Luciana insistiu em dar carona, mas Ricardo alegou que morava muito longe. Na verdade, Ricardo estava receoso de que Luciana fosse uma mulher possessiva e neurótica (o que era de fato, a intuição não falha!) a ponto de procurá-lo no Méier (isso provavelmente aconteceria). Preferiu sair pela tangente.

Despediram-se. Ricardo desceu as ruas de Botafogo em direção a orla e pegou o 455. Já despontava uma linda e ensolarada manhã de domingo, onde velhinhos desciam para comprar pães na padaria, jovens caminhavam para a praia e outros chegavam em casa depois de uma noite de algazarra, excessos, sexo, drogas e rock and roll.

terça-feira, 17 de junho de 2008

GAROTA MACABRA

Com alguns minutos de atraso, eu desci pelas escadarias do metrô. Era o ultimo da noite. Mais parecia um vulto mal assombrado com a camisa do Anthrax do que um simples passageiro do metrô. Diego já me esperava há um tempo, já se acostumou com essa cena. Sempre me atraso, por mais que eu tente ser pontual. Não sou nada britânico. A distância também não ajudava muito. Era o último fim de semana do ano, o que fazia a noitada ser mais especial. Pegamos o metrô e descemos em Botafogo. Lá a gente encontraria mais alguns amigos e a festa estaria completa. Afinal, era o ultimo fim de semana do ano. A próxima farra, só no reveillon, em Copacabana.

A boate tinha um formato bem curioso, pois misturava características modernas dentro de uma casa antiga, daquelas típicas do Rio Antigo, além de ter vários ambientes. Um pra conversar, outro pra jogos e vídeo clipes e no segundo andar, a pista de dança vermelha e cheia de fumaça de cigarro. O lugar não estava muito cheio, mas dava pra se divertir e pelo visto logo chegaria mais gente. Lá encontramos mais dois amigos que já estavam nos esperando na porta e entramos na boate, ao som de White Stripes.

Depois de algumas horas, muitas cervejas, maços de cigarro e uns baseados, eis que surge naquele ambiente frio, enfumaçado e escuro, uma garota de cabelos pretos, pele clara, olhos puxados (parecia uma japonesa), baixinha e sorridente. Sua blusa era sugestiva: era preta, com o símbolo dos Rolling Stones, aquela boca vermelha, com a língua pra fora. Chamava a atenção de todos. Seu magnetismo era forte.

Nós então éramos quatro babacas enfileirados com os copos e cigarros na mão assistindo aquela cena: uma série de caras abordava a tal garota e saíam como se tivessem deixando um guichê pra trás. Desapontados. Cabisbaixos. A cena era muito divertida, engraçada. Para os candidatos, uma cena sem graça. Já chegava o momento (isso era o que eu sentia, mas ninguém declarava) em que um dos quatro teria que chegar junto e quem sabe ou tomar o caminho da roça como os outros, ou ser o felizardo da noite.

Então, nós trocamos olhares do tipo “quem vai chegar junto primeiro?” até que eu, logo o mais devagar e mais tímido do grupo, vira e diz “deixa que eu vou lá”. (Era a pinga, a velha tática dos tímidos) Todos estranharam a minha atitude, mas eu tava tão decidido que ninguém disse nada, mas provavelmente deve ter pensado: “lá vai mais um levar um fora dessa guria marrenta”.

Eu me aproximei e comecei a conversar com a garota. Ela se chamava Marina, morava no Leme, tinha 21 anos e estudava cinema em Niterói. Diferente do que eu imaginava, ela estava bastante receptiva e sorridente. Depois de alguns minutos de conversa, um beijo. Enquanto isso, os outros estranharam ver logo eu, que fica num empate sem gols na maioria das noitadas, com aquela morena que parecia ser “a difícil” da noite. Não demorou muito pra Marina convidar pra esticarmos a noite no seu apartamento ao invés de ficar ali em Botafogo.

Saí da boate com uma em cada braço. A outra era a irmã que dividia o apartamento com Marina. No início, pensei que ela estragaria a noite, depois pensei que poderia rolar um ménage (eu e meus delírios repletos de sacanagem sem culpa), mas na realidade ela estava completamente bêbada e precisava de uma cama e de uma ducha com urgência.

Pegamos um táxi. Não levamos muitos minutos até o Leme. O taxista era a cara do Paulo Francis, o que arrancava em mim algumas risadas tímidas. Marina passou a rir depois que eu mostrei a ela o sósia dirigindo o táxi. Ela não fez cerimônia e apalpou meu pau, dando sinal de que rolaria algo mais essa noite. Eu estava realmente curtindo a noite completa. A ultima noitada do ano eu estava fechando com chave de ouro: farra com os amigos primeiro, e na cama com uma guria que conhecera na mesma noite depois.

Chegando no apartamento, a irmã foi direto a nocaute. Se o mundo estivesse acabando, acho que ela não acordaria nem por um decreto. Perfeito. Pois assim, poderia trepar com Marina em paz. Mas os eventos surreais não pararam por aí. O apê dela parecia uma filial da SUIPA! Tinha cinco cachorros e seis gatos. Ta certo que eu senti um cheiro forte de bicho quando entrei lá, mas o tesão pra trepar e as várias doses de álcool serviram como sedativo nasal.

Lavei o rosto na pia da área de serviço e quando entrei no quarto lá estava a garota, branca como a neve, de lingerie preta, pra combinar com o cabelo – pensei. A garota parecia insaciável. Transamos. Ela era muito boa por cima. Fazia tempos que num encontrava uma guria que fizesse bem a minha posição predileta. Lindo par de seios. Grandes. Rosados. Suculentos. Depois de transas, delírios, conversas e cigarros, dormimos feito crianças. Eu precisava voltar pra casa. Precisava mesmo?

Quando fui ao banheiro na manhã seguinte, pra tomar uma ducha e recuperar as energias, presenciei um lance engraçado: o chão do “toalete” era forrado de jornal! Ou seja, o banheiro para os “humanos” era o mesmo para a bicharada! Eu não estava chapado a ponto de criar essas imagens na cabeça! Que horror! Na mesma hora perguntei: que porra é essa? Recuperado, desci a rua e peguei o bom e velho 455.

Dias depois era ano novo. Diferente do que eu cogitei, não me encontrei com Marina. Passei o ano novo enchendo o pote com meus amigos. Naquela multidão de Copacabana seria impossível encontrá-la. Eu até liguei, mas ela não pode se encontrar comigo. Comecei aquele ano sem “boas entradas”, porém vi o mundo girar...

Depois desse início rápido e libidinoso, as coisas começaram a se encaixar no seu devido lugar, ou melhor, nos lugares errados. De forma estranha. Os acontecimentos aos poucos sinalizavam, avisavam, mas eu não dava a mínima. Inicio de relacionamento tudo são rosas, os casais não brigam, são eternos enamorados, um romantismo beirando a perfeição. E o tesão a flor da pele. É uma fase em que todos nós estamos parcialmente cegos. Eu também. E nessa fase não percebia muito os aspectos mais estranhos de Marina. Mas também não estava amando a garota. Estava mesmo bastante carente, mas não tão apaixonado. Excitação, isso sobrava!

Não demorou muito pros sinais “estranhos” aparecerem na minha frente. Marina tinha uma filha, mas morava em Fortaleza, do outro lado do país. Ela disse que a filha era criada pelo pai. Eu estranhava: mães não abandonam filhos pelo mundo. A frieza de Marina aos poucos me incomodava. Porque não era só isso, era realmente uma garota fria e materialista. Só falava de grana. Raramente falava da família, mas quando acontecia, era só grana, grana, grana, compras, compras... A coisa só mudava de figura quando a gente transava.

Eu já dava sinais de irritação. Onde se viu marcar horário pra se encontrar com a “namorada”? Sim, no momento já estávamos com três meses de namoro, quase quatro. E isso me deixava puto mesmo. Era rotina. Eu ligava pra Marina cheio de carinhos, ela me atendia bem seca. Perguntava quando podíamos nos encontrar, ela falava como se fosse uma puta arranjando espaço na agenda. Fora quando a gente se encontrava ela num era capaz de dar nem um “oi”. Parecia uma colega distante. O que me consolava eram as noites de sexo, Lucky Strike e cervejas importadas no seu apartamento.

Uma vez, no meu trabalho, estava conversando com uma colega, ela devia ter uns 50 anos e parecia àquelas tias coroas que distribuíam conselhos como souvenir. A gente sempre bebia depois do expediente. Era uma baita guerreira, gente boa, cheia de experiência. Ela tinha um sotaque baiano bem divertido e depois de contar o meu resumo da ópera, ela disparou a queima roupa: “porra cara, pra mim quem faz essa de marcar hora pra ver namorado pra mim é rapariga da porra! (porra pra ela parecia vírgula e eu adorava isso) Puta mesmo! Cai fora que o barco ta afundando rapaz. Espero que saiba nadar. Essa num vale meio quilo!” Entendi o recado, repleto de metáforas e afins. Mas num deixava de ser tão direto como um soco do Acelino Freitas. Precisava mesmo ouvir isso.

Esse relacionamento já se sustentava à base de sexo e mais nada. Mas nem isso tava dando mais vazão. Já estava ficando de saco cheio daquela maneira fria e calculista. Pessoas bem próximas reparavam e me alertavam a respeito desse jeito estranho dela. Aliás, eram pouquíssimas pessoas que sabiam desse relacionamento. Poucas mesmo. Ela se esquivava sempre. Algo precisava ser feito. Precisava de ares novos. Estava puto ao extremo. Juntei meus trapos e me mandei pra São Paulo sem ela saber. Liguei o foda-se!

Lá, fiquei na casa de um amigo meu, punk. Pablo era um puta amigo, sempre ficava na casa dele quando colava em Sampa. Era um final de semana que eu não fazia há tempos. Depois de me instalar na casa do cara, era hora de sair. Pablo me deu a idéia de aparecer num barzinho na Vila Madalena, um bairro bem legal lá na terra da garoa. Pegamos o metrô e rumamos para a boemia da paulicéia.

O local era bastante agradável e parecia bastante com aquele que encontrei Marina pela primeira vez. Mesmo assim, isso não veio muito a minha cabeça. Fiquei mais com a impressão da semelhança dos locais do que com a imagem da garota. Depois de umas rodadas de cerveja, eis que surge uma loira, alta, de traços germânicos, no meio do bar. O filme parecia se repetir.

Trocamos olhares e como eu já estava bem alto, estava com coragem suficiente para chegar naquela guria germânica. Seu nome era Patrícia. Era de Santa Catarina, a Alemanha brasileira. Era alta e corpulenta. Simpática e acessível. Saímos para tomar uns drinques e bater papo.

Tínhamos muitas afinidades: sulista, como meus pais, morava em São Paulo há quase um ano, trabalhava e estudava. Ela se interessou mais quando disse que era carioca, apesar das raízes fincadas lá no sul do país. Depois de muita conversa e “dancefloor”, voltamos a mais rodadas de cerveja. Estávamos todos alterados e felizes. E finalmente beijei Patrícia. (estava rolando Ramones nessa hora! Foi bem legal!) Mas foi mais pela pressão psicológica da sua irmã. Já estava fatigado, pois era uma mulher difícil. Depois disso, o que seguiu foi uma série de viagens a São Paulo “á lazer”.

Voltei ao Rio decidido a acabar o relacionamento com a garota macabra. Esse foi o apelido dado á ela por um grande amigo meu que inclusive estava lá no momento em que a conheci. E fazia realmente sentido o apelido. Fria, maquiavélica, sombria, mercenária, estranha, negativa, carregada. Macabra porra!

Na primeira vez que eu a encontrei – ela com uma minissaia bem curta, toda decotada, realmente um tesão -, depois dessa viagem, o clima já estava mais do que estranho, mas mesmo assim, teve espaço para a transa habitual. Marina de calcinha preta e camisa do Iron Maiden (alias, a minha camisa sumida e surrada do Maiden!) de pé depois da nossa transa preparando algo pra comer era uma cena muito bonita de se ver. Uma intimidade que não tinha já fazia algum tempo. Eu realmente gostava de vê-la desfilando pela casa daquele jeito: a menina macabra andando pela casa como se nada tivesse rolado antes. Era uma ilha de tranqüilidade singela em meio a um oceano turbulento e nebuloso.

Depois desta cena, conversamos e aos poucos sentíamos que o relacionamento caminhava para o final. Ela sentiu que eu estava estranho. Ela mudava o assunto em segundos. Passava a falar mal do ex-marido e daí desatinava a falar de finanças. Não ligava pra filha. Não ligava pra porra nenhuma. Estava agressiva e arredia. Seu jeito sombrio às vezes me assustava.

Eu me afastava dela cada vez mais. De repente, deixava de sair do subúrbio até as boates da zona sul, para pegar os ônibus em direção a São Paulo. O astral com Patrícia era outro. Era como se eu enxergasse a luz depois de um tempo nas trevas. Atenciosa, meiga, carinhosa, linda. Era exatamente o oposto da “macabra”. E aos poucos vislumbrava, lá no fundo, um futuro com aquele anjo loiro de sotaque sulista.

Voltei ao Rio e ainda tive compaixão de emprestar uma grana pra garota macabra. (esse apelido desde então passou a ser rotineiro, a ponto de não me lembrar do seu verdadeiro nome) Dei um ponto final na historia. Fui até a casa da guria e disse tudo o que aconteceu. Ela ficou cabisbaixa e jamais vai sair da minha mente a imagem da garota macabra sentada ao lado na cama, triste, aquela brancura toda contrastando com a escuridão do cabelo, que eu já associava ao seu jeito de ser. Senti uma pontada, uma agulha fria. “Me ajuda!”, era o que dizia. Virei imediatamente pra ela. Estava sentada ao meu lado naquela cama que tantas vezes fomos alegres, escondemos o sol com a peneira. Mas desta vez estava muito cabisbaixa, seus cabelos cobriam a sua face, e suas mãos estavam cerradas ao seu lado, como se tivesse se segurando. Era como se naquele silencio mórbido, ela tivesse pedindo por isso. Ela sentia a minha falta. Será? Eu trouxe uma fresta de luz naquela vida atormentada. Mas que já me atormentava. Era hora de fechar mais uma página.

Voltei a São Paulo mais algumas vezes. Acho que foram umas sete vezes ao todo. Depois o romance também desandou. Patrícia estava mais comodista. Relutava para vir ao Rio. Aos poucos, fui me afastando da idéia de manter algo mais sério. A distância já estava atrapalhando. E foi melhor assim, pois a trama já estava ficando cada vez mais envolvente. Não queria mais torrar a paciência. Desta, eu me afastei gradualmente. Era bem mais fácil. E fechei mais outra página.

Meses depois me encontrei com a garota macabra duas vezes, mas em épocas bem distintas. Da primeira, me esbarrei com ela numa boate em Botafogo. Cobrei a grana que ela me devia. Ela me enrolou, mas já tava de saco cheio. Estava mais sombria e chapada do que nunca. Carregada. Negativa. Dava arrepios.

Muito tempo depois, voltei ao apartamento dela no Leme. Parecia o fim do mundo. Havia mais de vinte bichos espalhados por aquele apartamento que era bem pequeno. Cheiro insuportável, uma sujeira só. A irmã abandonou o barco e voltou para Fortaleza. “La Macabra” continuava bonita, porém decadente, algo que ela sempre foi mesmo. Conversamos amenidades frívolas. Passar o tempo mesmo. Estava mais do que estampado a vontade dela em reviver os velhos tempos, as velhas transas. Mas quem vive de passado é museu.

Falei que precisava descer, comprar cigarros (Mentira). Já me sentia angustiado demais naquele apartamento. Não agüentava mais aquela cena tão terrível. Desci e peguei o primeiro ônibus pra casa. Enquanto pensava nos novos rumos que eu almejava pra minha vida, pensei na angustia e na aflição de Marina. E mais uma vez me veio àquela sensação estranha, aquela telepatia mórbida, mas que nunca falhava: desta vez, ela estava ao mesmo tempo puta da vida e extremamente decepcionada, porque dispensara vários programas só para me receber. O último fio de esperança. Esperava alguma satisfação depois de meses na nova vida de garota de programa. No ano seguinte, soube que Marina veio a falecer vitima de overdose.

domingo, 15 de junho de 2008

TRAIÇÕES FRATERNAS

Adriano namorava Fernanda há quase um ano. Neste mesmo tempo de relacionamento, teve como companhia em mesas de bares além dela, claro, sua cunhada, Ingrid e seu respectivo namorado ou algum trouxa da vez. Não era sempre que isso ocorria, mas havia uma freqüência regular. Quando não era Ingrid, era algum casal de amigos, ora de Fernanda, ora de Adriano. Claro que o casal saia sozinho também. Não demorou muito para que Ingrid, mais saidinha, e Adriano, construíssem uma certa afinidade.

Ingrid era baixa e bem diferente da sua irmã. Tinha cabelos ondulados e um jeito de garota bem interesseira, daquelas que procuram o golpe perfeito. Tinha a cara da Gwen Stefani. Era bem desorganizada e relaxada. Gastava horrores com tintas para cabelo. Deveria ter alguma cisma, uma síndrome de Cindy Lauper ou Madonna. Material Girl poderia ser seu apelido, sobrenome ou até mesmo rótulo. Era uma garota materialista e interesseira. Costumava transar e eventualmente namorar caras que de preferência buzinassem na portaria do seu prédio para buscá-la. Sair e voltar a pé pra casa depois da noitada era um crime para ela. Sentia uma ponta de inveja dos relacionamentos estáveis da irmã mais velha, Fernanda, mas não demonstrava. Costumava arrotar bem alto que “homens não prestam e devem ser todos usados”. Era uma baita Maria-gasolina, safada, sempre a procura do golpe perfeito. Traia seus namorados a torto e a direito. Quanto mais velho, mais babão - o que ela adorava -, melhor, pois podia pintar o sete com os idiotas. Não valia porra nenhuma. Fidelidade era uma palavra sem sentido em seu glossário. O que valia eram os valores materiais, como uma bela moto, carro e uma conta bancária bem gorda que pudesse satisfazer suas taras consumistas. Seu namoro era com o cartão de crédito dos outros. Orgasmo, só com o carro, a moto ou a conta bancária dos babacas que ela arrumava.

Já sua irmã mais velha, Fernanda, era exatamente o oposto: metódica e organizada. Tinha caráter. Trabalhava, tinha sua grana, era bem honesta e não ligava se o cara tivesse ou não um carro, embora volta e meia reclamava porque Adriano não tinha um. Isso sempre gerava discussão. Ele ficava revoltado, pois não gostava das idéias da sua cunhada, que pelo visto já contaminava um pouco a mente de Fernanda. Mas era só paranóia, não havia motivos para ficar preocupado. Fisicamente, era diferente de Ingrid por ser mais alta e também não ter a obsessão da irmã em ficar loira. Era bem mais bonita justamente por não ser vulgar. Corpulenta, sensual, tinha um charme envolvente, sem apelações. Outro grande problema eram os problemas psicológicos de Fernanda: insegura, neurótica, de arrumar coisas onde nada existe, complexada e tinha pavio muito curto. Sempre foi uma dinamite ambulante, sem motivo aparente. Seu ciúme doentio a transformava em outra garota, dava ataques, falava alto e gesticulava. Seu ciúme era daqueles em que você nem podia olhar para o outro lado. Era uma neurótica de carteirinha.

Ingrid estava novamente sozinha. Pegou seu namorado no flagra e decidiu acabar o relacionamento. O feitiço caiu contra a feiticeira. Seu namorado, com vinte anos a mais do que ela havia trocado sua presença por uma bela quarentona de Ipanema, logo, com uma conta bancária bem gorda, além de ser da mesma faixa etária do cara. Ela estava bastante revoltada com a situação e, para apaziguar os ânimos, decidiu dar uma volta, beber e tentar ficar com o primeiro otário que surgisse na sua frente. Preparou-se para a caça: meia arrastão, bota de 15 centímetros, um decote ousado, minissaia e jaqueta de couro, batom vermelho e litros de perfume. Foi então a caça de mais outra vítima. Ou de algumas doses para esquecer a decepção.

Fernanda e Adriano andavam brigando muito, ao mesmo tempo em que Ingrid reparava bastante no cunhado. Ele até percebia, mas não dava tanta importância. As discussões tinham geralmente uma semana de intervalo. Mas com o passar do tempo, esses intervalos foram diminuindo, o que transformava o namoro numa batalha. Fernanda estava muito ciumenta, dava ataques na frente de todos. Tinha o dom de transformar as coisas numa problemática sem motivos. Era tempestade num copo d’água. Na última, pegou umas mensagens no celular que Adriano recebeu de uma amiga do trabalho. Fernanda respondeu xingando a garota de vadia pra baixo, causando uma confusão tremenda. Ele conseguiu contornar a situação, mas já estava perdendo a paciência com os ataques de ciúmes. Fernanda já rasgara fotos de amigas e primas. O conto não caminhava muito bem para os dois. O relacionamento chegava ao desgaste.

Foi então num sábado à tarde que Adriano ligou para Fernanda. Precisavam aparar as arestas. Quem atendeu ao telefone foi Ingrid, com aquela voz suave, rouca e ao mesmo tempo, sensual. Ela então avisou ao cunhado que sua namorada não estava em casa. Assim, começaram a conversar sobre amenidades e o papo rendeu o suficiente para que Ingrid sugerisse que o cunhado viesse e esperasse Fernanda em Vila Isabel, onde as duas moravam. Adriano então concordou e foi para o apartamento delas, sabendo que o papo renderia uma conta bem cara no final do mês. Caiu direitinho na lábia da cunhada.

Ingrid sabia que sua irmã demoraria bastante e que Adriano estaria em Vila Isabel em 20 minutos. Quando ele chegou, deparou-se com Ingrid vestindo apenas um top branco bem decotado, um short preto bem curto, cabelos soltos e olhar penetrante. Sem lingerie.

Após falarem sobre o cotidiano, Ingrid começou a falar sobre sua vida pessoal. Não parava de reclamar. Parecia uma metralhadora, não parava de cuspir. Acendia um cigarro atrás do outro, parecia uma chaminé. Depois, falou abertamente sobre a sua vida sexual. Descrevia os mínimos detalhes. Adriano sempre achou que Ingrid só chegava ao orgasmo quando sentava na garupa de uma Harley-Davidson, de tão materialista que era. Uns broxavam, outros trepavam mal, poucos fizeram ela gozar. Reclamava sem parar do ex-namorado e cismava em dizer que homens eram safados e todos iguais. Obviamente, Adriano discordava. Sua réplica era repleta de clichês, dizendo que nem todos eram assim, que estava equivocada e que precisava rever conceitos e bla bla bla. Enquanto isso esperava inocente pela namorada, que custava a chegar. O que amenizava era o bom papo que batia com a cunhada, porque se não fosse isso, já teria desistido de esperar.

Já Ingrid afirmava incessantemente que os homens não valiam porra nenhuma e perguntava o que ele faria se uma mulher o seduzisse longe de sua namorada, sem que ela soubesse do fato. A pergunta era capciosa, delinqüente e perigosa. Ingrid era esperta e tentava não deixar o ambiente parecer como se fosse um teste de fidelidade, até porque aquilo aparentemente não passava de uma simples e apimentada conversa entre cunhados. Ela cruzava as pernas, esbarrava no cunhado, provocava. Roçava os braços e os pés. Era inevitável não reparar naquelas pernas lisas e torneadas que Ingrid propositalmente exibia. Adriano negava tudo, mas não percebia que Ingrid cada vez mais se aproximava. Ela acariciava, tocava, alisava os cabelos e provocava cada vez mais.

A cada minuto que passava, cada frase maliciosa dita naquela conversa, Ingrid se aproximava. Ela sabia que Adriano não resistiria as suas provocações. Após as insistentes esquivas do cunhado, Ingrid saltou e deu um beijo. Ele se desvencilhou e perguntou se estava louca. Ingrid sempre gostou do perigo, abriu um sorriso malicioso, respondeu afirmativa e montou em cima de Adriano, que não resistiu. Deu um beijo sufocante, enquanto arranhava o peito.

O clima esquentava na medida em que os minutos corriam, as mãos percorriam freneticamente os corpos que ficavam cada vez mais suados. Os peitos nus se encostaram e ele sentia aqueles seios firmes e dilatados de Ingrid, que instigavam ainda mais. O risco de Fernanda aparecer a qualquer momento e pegá-los no flagra dava um tesão ainda maior. Já não havia mais como resistir àquela loira insaciável. Ingrid abriu violentamente a calça do cunhado e começou chupá-lo. Adriano nesse instante já começava a comparar mentalmente as irmãs, assim como sua cunhada faria de tudo para prová-lo como era melhor na cama do que sua irmã mais velha. Típica disputa.

O olhar de Ingrid era penetrante e agressivo. Os dois se engalfinhavam como dois animais. Arranhões, tapas, mordidas. Rastros perigosos. Ele então resolveu entrar na brincadeira das comparações para ver até onde chegava o limite da cunhada. Quanto mais ele dizia que Fernanda era melhor, mais instigada ficava a garota. Ingrid parecia um vulcão em erupção, era como se não transasse há tempos. Talvez por isso reclamava tanto. Entraram no quarto de Fernanda e transaram ali mesmo, na cama da irmã, da namorada. Sem culpa.

Ingrid cismava no “jogo da comparação”, e achando que sua irmã jamais fizera sexo anal com o namorado (era muito certinha para tal coisa, pensou) desandou a sentar freneticamente. Ao ver a face de Ingrid suja de esperma e sorridente, sentiu-se realizado e constatou de uma vez por todas que sua cunhada era mesmo uma tremenda devassa. Não havia limites. Esta era uma prova real que deveria permanecer em segredo.

Arrumaram o quarto. Sumiram com os vestígios, pois crimes perfeitos não deixam suspeitos nem pistas. Como num milagre, minutos depois chegou Fernanda, toda sorridente, feliz com a visita surpresa do seu namorado. Agora, olhares e sorrisos ganharam outros significados. Adriano e Ingrid já estavam recompostos, fumando e conversando como duas pessoas civilizadas, como se nada tivesse acontecido, mas cientes de que precisavam guardar um segredo para sempre. Eram cúmplices de uma trama cínica e sórdida, mas bem divertida. Fernanda não imaginava quão puta era sua irmã. E tão mentiroso e mau caráter era o seu namorado.